O Direito do Trabalho passou por diversas alterações desde a edição da Reforma Trabalhista, inclusive em relação ao direito coletivo. E dentro desta temática, chama à atenção a discussão acerca da possibilidade da prevalência do negociado sobre o legislado.
Ao examinar a matéria e a fim de pacificar a controvérsia, em 14/06/2022, o Supremo Tribunal Federal entendeu que é constitucional a livre negociação coletiva e a sua prevalência sobre a legislação, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis. Esse entendimento do STF é amplo e a sua aplicação específica deve ser interpretada caso a caso.
Nesse sentido, após o julgamento proferido pelo STF, muitas dúvidas têm surgido acerca da constitucionalidade de cláusula inserida nas Convenções Coletivas dos bancários desde 2018, que autorizou a compensação do pagamento da 7ª e 8ª horas extras com a gratificação de função paga na vigência do contrato de trabalho, na hipótese de descaracterização do cargo de confiança pela Justiça do Trabalho e o reconhecimento do direito às horas extras a partir da 6ª diária (artigo 224, “caput”, da CLT).
Isso significa, em tese, que ao serem apuradas a 7ª e 8ª horas extras conquistadas por meio de decisão judicial, estaria autorizada a compensação da gratificação de função que foi paga ao bancário, pois o STF decidiu que, havendo norma coletiva esta irá prevalecer sobre a lei.
Contudo, mesmo após a decisão do STF, a aplicação de referida cláusula tem sido alvo de acirrados debates no meio jurídico. Isto porque, por certo o negociado poderá prevalecer sobre o legislado, porém desde que o negociado não seja inconstitucional, que é a conclusão que se extrai da análise da indigitada cláusula inserida nas Convenções Coletivas dos bancários, que inadvertidamente autorizou a compensação da 7ª e 8ª horas com a gratificação de função. E por que isto acontece?
Inicialmente, é preciso esclarecer que a natureza jurídica das horas extras é totalmente diferente da gratificação de função, o que, por si só, impossibilita a compensação mútua de tais títulos. A gratificação de função visa remunerar o bancário pela maior responsabilidade de suas atividades desempenhadas dentro da jornada legal ordinária, e não a jornada extraordinária. Já a 7ª e a 8ª horas de trabalho, são devidas face o reconhecimento do enquadramento judicial no artigo 224, “caput”, da CLT, e devem ser pagas ao bancário, como labor extraordinário, independente do recebimento da gratificação de função.
Assim, descaracterizado o cargo de confiança, forçoso reconhecer que a gratificação de função foi paga como SALÁRIO BASE FRAUDULENTO, destinado, em verdade, a remunerar a jornada normal de 6 horas e jamais as horas extras prestadas. Isso porque, o trabalhador bancário obrigado a cumprir 8 horas de trabalho, recebe a gratificação de forma COMPLESSIVA.
Nesse sentido, não há que se falar em compensação porque o trabalhador bancário não é devedor do banco, tampouco há dívidas líquidas e vencidas em favor deste compensáveis.
Registre-se ainda, a violação ao Princípio Constitucional da Progressividade dos Direitos Sociais, sendo certo que a cláusula 11ª, §1º, da Convenção Coletiva de 2018/2020, e aditivos, representa intervenção na atividade privativa do Poder Judiciário, e não de prevalência do negociado sobre o legislado, matéria esta julgada pelo STF.
É evidente ainda, que a norma coletiva violou o artigo 5º, inciso II, da Constituição Federal (Princípio da Legalidade), haja vista que autorizou a dedução dos valores pagos ao trabalhador bancário a título de gratificação de função, não obstante as verbas “gratificação de função” e “horas extras” possuam natureza jurídica diversa e, por isso, não são compensáveis.
Portanto, mesmo após firmado o entendimento pelo STF acerca da prevalência do negociado sobre o legislado, a conclusão a que se chega, em relação à categoria bancária, é a de que o parágrafo 1º da Cláusula 11ª da Convenção Coletiva dos Bancários é inconstitucional, e assim, não há que se falar em sua aplicação. Fato é que o julgamento proferido pelo STF não declarou a constitucionalidade automática de toda e qualquer norma negociada, o que deverá ser analisado no caso concreto.
No âmbito judicial, o entendimento acerca do tema não está pacificado. De qualquer forma, mesmo após a decisão do STF, tem sido mantida a tendência de não se aplicar a aludida cláusula convencional, em especial pelas razões aqui articuladas. Assim, o direito ao recebimento de horas extras pelos bancários, inclusive da 7ª e 8ª horas, sem qualquer compensação com a gratificação de função paga, tem sido assegurado por decisões da Justiça do Trabalho.
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